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João Teixeira, presidente da Direção da Audiogest:

Abril 25, 2020

 

A crise pandémica chegou ao sector da Cultura como um verdadeiro diluvio não anunciado. De um momento para o outro a atividade cultural ficou suspensa.

Num sector já de si depauperado de capital e recursos financeiros, que vive (ou melhor sobrevive) no limiar da subsistência e muito abaixo do patamar da rentabilidade, o momento não poderia ter sido pior. A suspensão de concertos, festivais, espetáculos deixou também largos milhares de vidas suspensas, no exato momento em que as datas já marcadas anunciavam o despertar da atividade, após a cíclica “hibernação” de outono inverno.

Mas, pior que isto, pior que tudo, é que o drama não tem sequer fim à vista para a atividade cultural. A realidade que estamos a viver e que, até há meses atrás, não era imaginável nem num pior pesadelo, corre o risco de subsistir muito além do horizonte do estado de emergência.

E não será um necessariamente lento despertar, que as recentes declarações do primeiro ministro deixam antever, que trará a luz no fundo do túnel. Na área da música a esmagadora maioria dos projetos artísticos não dependem de qualquer subsídio estatal. Dependem da dedicação e talento de artistas e do investimento privado para a sua sobrevivência. Serão casos raros – a existirem – os de produções privadas que possam ao menos cobrir os custos com 1/3 ou mesmo metade da lotação.

Quem mais sente os custos diretos da crise são desde logo os artistas, mas também os elos mais fracos desta cadeia de valor: os técnicos e profissionais de espetáculo, marcados por uma elevada sazonalidade, intermitência de trabalho e rendimentos e elevada precaridade. E a estes não se lhes pode pedir que produzam a partir de casa.

Sentem também os produtores e editores musicais, desde logo com a perda de vendas físicas, mas também com a inexistência de um mercado minimamente robusto e equitativo de vendas digitais que lhe possa amparar a queda. 

A Indústria Musical, entendida em sentido lato, é de facto dos negócios mais arriscados que conheço. É também dos que geram maiores alteridades sociais e económicas, contribuindo para elevar a cultura e a moral de todo um povo e sendo uma peça cada vez mais relevante para uma economia assente no turismo, já para não falar da altíssima taxa de valor acrescentado bruto para economia (superior a 90%) transversal a todas as indústrias culturais e criativas.

E são precisamente estes fatores de elevada fragilidade e enormes alteridades que justificam, nesta situação extrema, o apoio público direto, claro e decidido ao sector cultural.

Ao contrário de outros países europeus não há em Portugal qualquer fundo público de verdadeira emergência para acudir o sector cultural, ao contrário do que ocorre com outras áreas da atividade económica em Portugal, não há qualquer medida desenhada especificamente para este sector, com tantas especificidades estruturais e nesta particular conjuntura. Ao contrário do que ocorre com a comunicação social, não há qualquer investimento publico extraordinário para acorrer à crise de um subsector da cultura que não é subsidiado. Ao contrário do que impunha o menor bom-senso os profissionais de espetáculos estão abandonados à sua sorte.

É neste cenário que a AUDIOGEST, entidade que representa em Portugal os produtores musicais, resolveu agir e num esforço financeiro enorme para esta entidade mas quase insignificante para “apagar o fogo”, resolveu disponibilizar 500 mil euros para acudir à emergência do setor musical, juntado os seus esforços à GDA (Gestão de Direitos dos Artistas) para dar toda a ajuda possível à subsistência de empresas, postos de trabalho e profissionais independentes do sector.

Não se trata de “ajudar os nossos”, mas de ajudar todo o complexo e frágil ecossistema da indústria produção e promoção musical. Numa altura em que, mais que nunca, todos precisamos uns dos outros, a AUDIOGEST diz presente e espera lançar as candidaturas já no inicio do mês de maio.  

Resta-nos esperar que o Governo faça também a sua parte, crie um verdadeiro fundo de emergência, e – ao menos – não tribute apoios de subsistência e permita que o parco apoio que possamos conceder não inviabilize o ainda mais parco apoio estatal aos profissionais ditos “independentes” do sector.

Talvez assim possamos, de facto, “ficar todos bem” ou pelo menos, menos mal.

 

João Teixeira

Presidente da Direção da AUDIOGEST


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